Quando o planeta já não mais podia suportar a humanidade, uma luz brilhou no horizonte e subiu aos céus.

domingo, 31 de janeiro de 2010

75. Fogo no Céu

Podíamos ouvir as garras arranhando a parede e a barricada no andar debaixo. Mesmo a quatro metros de altura, a janela parecia ser apenas um pouco mais alta do que os cães conseguiam saltar. O focinho de um deles chegou a aparecer de relance, e em uma fração de segundo Prank conteve o impulso de disparar. Mesmo sob o vento que corria pelas ruas destruídas era possível distinguir o som de dezenas de criaturas cheirando e fuçando em cada canto, procurando um modo de nos alcançar. A tensão quase podia ser sentida com as mãos. Por um tempo incontável mal respiramos, na esperança que desistissem de nós, mas a possibilidade de carne fresca dava àquelas aberrações uma determinação impossível.

De olhos vidrados na janela, Prank mexeu as pernas num espasmo estranho. Pensei que ele se levantaria e pularia pela janela, mas então chacoalhou a cabeça e piscou vigorosamente, como se voltasse à realidade. Olhou para mim e passou o dedão pela garganta, num sinal entendido pelos militares como uma ordem para matar. Fiz que não com a cabeça, mas ele simplesmente se levantou, apoiou a metralhadora no ombro e se aproximou da janela procurando um alvo. Eu já me preparava para levantar e me juntar à matança quando um grito quase inaudível fez tudo silenciar. Ao longe alguém gritava de desespero, em meio a disparos de espingarda. Imediatamente, como uma gigantesca sombra se movendo pela rua, as criaturas que nos cercavam avançaram em direção aos sons.

Lembro-me pouco do que aconteceu em seguida. Sei que Prank e eu olhamos um para o outro e concordamos no mesmo instante que aquela era hora de partir. Pulamos a janela em segundos e desatamos a correr pelos escombros da rua, agora vazia. Corremos sem olhar para trás, e não paramos nem mesmo para ajudar um ao outro quando inevitáveis tropeços e escorregões aconteceram. Quando finalmente nos aproximamos do acampamento de Amrak um enorme facho de luz nos cegou, fazendo-nos parar em uma derrapada. Protegemos os olhos com os braços, mas já estávamos ofuscados. Mal pude ver quando dois homens se aproximaram de nós, de armas em punho, e nos mandaram erguer os braços. Não tínhamos muita escolha, então obedecemos. Eu já suspeitava que o acampamento estivesse tomado, e já me preparava mentalmente para enfrentar o que quer que viria, mas felizmente não houveram surpresas. Um dos guardas tinha vindo comigo de Amrak e me reconheceu.

-Ei, é aquele cara que veio comigo de Amrak. Desculpem amigos, podem abaixar os braços e pegar suas armas. Estamos sendo precavidos, parece que uns tipos estranhos andaram passando perto demais do acampamento.

Sequer tivemos chance de perguntar ou contar algo sobre os Diabos quando um ponto luminoso escalou o breu da noite e estourou em uma cascata de fagulhas pouco abaixo da camada de nuvens manchando de vermelho-sangue a escuridão. Alguém pedia ajuda do outro lado das ruínas de Bermil.

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