Quando o planeta já não mais podia suportar a humanidade, uma luz brilhou no horizonte e subiu aos céus.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

36. Escombros e Gelo

Os escravizadores deviam estar nos observando desde o dia anterior. Sabiam que nossos veículos não eram os adequados para andar sobre montanhas de neve, e que isso nos forçaria a ficar na estrada. Mas, depois de uma tempestade de neve, mesmo as estradas ficavam intransitáveis a veículos comuns sem esquis, e essa era a maior vantagem deles. Veículos com limpadores de neve constantemente mantinham as estradas livres de neve, mas podia levar dias até que um desses percorresse aquele caminho e a deixasse limpa, até que a próxima tempestade a inutilizasse novamente. Nossos carros tinham correntes em volta dos pneus, mas a neve fofa era intransponível para eles.

Eu mal sabia dirigir em uma rua limpa e sem obstáculos, quanto mais em uma estrada cheia de neve e gelo, mas mesmo assim só pensava em pisar fundo no acelerador e sair dali. Levei poucos segundos para arrancar com o carro depois que Anne e eu entramos. Thompson ainda corria colina abaixo e praticamente se jogou porta adentro quando passamos por ele ainda acelerando. Eu estava me esforçando ao máximo para manter o carro na estrada, mas Thompson segurou o volante com uma das mãos e girou-o com força, fazendo o carro sair da estrada e subir o pequeno barranco de entulhos e terra que havia do lado.

-Mas que porra é essa que você tá fazendo? -Berrei de imediato, tentando fazer o carro voltar para a estrada. Mas Thompson segurava o volante firmemente, e falou com força, mas sem gritar:

-A neve se acumulou na estrada e está fofa. Aqui há mais gelo e detritos, onde as correntes podem conseguir apoio para não deixar os pneus girarem em falso. -Em principio não acreditei, mas logo estávamos andando mais rapidamente, ainda que com muitos trancos e solavancos. -Não acelere tanto, e reduza uma marcha. O motor precisa de mais força que velocidade, por enquanto.

Certo, certo! -Meu coração estava disparado, tentando abrir um buraco em meu peito para fugir. E quando eu pensava que não poderia haver mais descargas de adrenalina em meu sangue, Anne gritou ainda mais alto do que já vinha gritando enquanto fugíamos.

-Os escravizadores pegaram eles! -Exclamou desesperada, apontando pelo vidro traseiro para o outro carro, ainda parado no meio da estrada. Os veículos dos escravizadores os haviam bloqueado e agora rendiam seus ocupantes, que eram surrados até que caíssem no chão.

-Temos que voltar!

-Não podemos. Condenaríamos a nós mesmos se voltássemos. Vamos fugir antes que queiram nos perseguir. -Continuou serenamente Thompson, segurando novamente o volante, para que eu não fizesse a estupidez que tinha em mente, de voltar e tentar ajudar.

-Vamos voltar! POR FAVOR! -Implorou Anne. Mas tiros passaram assobiando pelo carro, corroborando a decisão de não voltarmos. Dois dos disparos acertaram a lataria do porta-malas, fazendo-nos abaixar as cabeças. Mas logo fizemos uma curva e estávamos fora de mira.

Depois de algum tempo tínhamos apenas o barulho das correntes se agarrando aos escombros no chão e os soluços contidos de Anne em meio ao seu choro silencioso. Lembro de ter criado coragem para olhá-la pelo espelho retrovisor, mas depois de ver seu rosto cheio de lágrimas e seus lindos olhos vermelhos de choro, desejei ter guardado na memória apenas seu sorriso do dia anterior.

Nenhum comentário: