Quando o planeta já não mais podia suportar a humanidade, uma luz brilhou no horizonte e subiu aos céus.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

15. Sonhos

Depois de viver alguns anos andando por aí em um mundo forrado de neve e gelo você começa a se acostumar com o medo de congelar enquanto mija, de trincar os dentes quando boceja ou de sentir seu próprio mal cheiro de nariz entupido. Mas todas essas coisas vieram se aconchegar em minha mente quando entrei naquela pequena vila, que se dava o título de "cidade fortificada", onde todos os seus habitantes seguiam as piores noções de higiene e saúde. Até um rato com sarna sabe que viver em cima de seus próprios excrementos não pode ser boa coisa, mas aquelas pessoas pareciam não se dar conta disso, ainda que todas elas aparentassem ter nascido antes da Explosão, quando higiene ainda se aprendia em casa. Todos os tipos de dejetos se acumulavam na muralha, como se fosse um reforço para que ela não se dobrasse com o vento, as pessoas eram imundas e maltrapilhas, havia algumas crianças, mas elas mais pareciam bolhas de sangue ambulantes.

Apesar de tudo o que havia de deprimente e infeccioso naquele lugar, eu me sentia confortável e, por que não, um pouco feliz. Era a primeira vez em muitos anos que eu estava em um lugar onde haviam muitas pessoas e, apesar de haverem guardas e provavelmente um líder, ninguém poderia me dar ordens sem que eu tivesse ao menos o direito de correr e morrer. Eu duvidava, desde o primeiro passo lá dentro, que alguém que ali morasse estivesse se importando com minha presença, todos pareciam interessados demais em morrerem em sua própria poça de vomito e fezes. Mas eu estava errado, e não demorei a saber que ali, todos os que portavam armas tinham ambições maiores que uma morte apática.

O guarda que permitiu minha entrada na vila me guiou por uma trilha escorregadia por entre os barracos e entulhos que se amontoavam por toda a volta, depois de alguns minutos chegamos a uma tenda branca, completamente destoante de todo o resto que havia à volta. Entrei pela porta de lona e não encontrei o esperado cheiro de podridão e a sujeira acumulada até o calcanhar, mas ao contrário, fui recebido com um delicioso cheiro suavemente doce, que me fazia lembrar de um tempo distante que eu provavelmente tinha esquecido que vivi. Ao fundo, sentada em uma cama, havia uma senhora de cabelos brancos e muitas rugas pelo rosto e nas mãos.

-Nuke... - disse com voz rouca e chiada a senhora. - Eu o estive esperando... Eu o vi em meus sonhos... Venha, sente-se aqui ao meu lado...

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