Quando o planeta já não mais podia suportar a humanidade, uma luz brilhou no horizonte e subiu aos céus.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

29. Festa

A noite caiu rápido. Arrumamos as poucas coisas que não vendemos ou que iríamos guardar em um trenó e pusemos toda a bebida e os cigarros no outro. Empurramos os veículos e os trenós pela pouca neve que se acumulava próxima às paredes das construções até chegarmos à casa onde disseram que poderíamos encontrar o Sherife. Havia muitos carros estacionados pela rua, música podia ser ouvida vinda da casa, luzes iluminavam o jardim arruinado enquanto sombras eram projetadas para fora das janelas conforme as pessoas lá dentro conversavam e dançavam animadamente. Fumaça saía pela chaminé e o cheiro de comida que se espalhava pelo ar era convidativo. Nos aproximamos da porta da frente, arrastando o trenó com as coisas pedidas. Dois guardas se aproximaram, estavam armados e já estavam fedendo a álcool.

-O que vocês querem, forasteiros? Essa festa é reservada. Apenas moradores podem participar. -Disse um dos guardas, que mascava alguma coisa e fazia um som nojento com a boca. Sua barba estava por fazer e seus olhos lutavam para não trançarem sua visão embriagada.

-Desculpe incomodarmos. Nós trouxemos essa encomenda para o Sherife. Ele as comprou hoje a tarde. -Falei com a maior paciência que pude juntar.

-Nós só viemos trazer as coisas e já vamos embora. Apenas isso. -E Thompson pareceu fazer um grande esforço para dizer essas palavras com uma calma que ele não queria.

-Sei. -Continuou ele. -Vai me dizer que ele convidou vocês para a festa também?

-Exatamente. - E minha paciência continuava intacta. Mas o guarda parecia ansioso para encontrar um motivo para brigar e minha cortesia com as palavras parecia deixá-lo ainda mais irritado. Thompson não parecia tão inclinado à paciência, suas mãos estavam cerradas, se contorcendo para não avançar no guarda. E quando o segundo guarda começou a formular algo para dizer, uma voz à porta falou:

-Finalmente! Estou tendo que servir bebida feita na cidade para esses beberrões, - falou animado o padre-sherife, enquanto descia pela escada da varanda e vinha nos recepcionar - e, tenho que admitir, ela não é lá muito boa! Trouxeram aquelas revistas? - Falou para Thompson, que ascentiu com a cabeça. - Então dê uma a esses dois e tragam essas coisas todas para dentro. Vamos animar essa festa!

Os guardas não pareceram muito felizes em terem sido contrariádos, mas apreciaram bastante a revista pois, soubemos mais tarde, ficaram tão entretidos com as mulheres nuas que deixaram dois penetras passarem, e estes roubaram uma boa quantia de créditos de um dos moradores. Créditos eram o dinheiro local, fornecido aos mercadores que ali faziam trocas, não tinha nome nem valia fora da cidade, mas servia para facilitar a cobrança das taxas impostas pelo Sherife. Entramos na casa e logo duas pessoas recolheram nossa mercadoria e levaram-na para um pequeno bar, montado no canto da sala de visitas, onde pelo menos 30 pessoas se amontoavam. Os cigarros fizeram sucesso, e logo havia uma cortina de fumaça impestiando o ar, as bebidas foram servidas e todos se divertiam. As revistas, que circulavam rapidamente de mão-em-mão, eram tratadas com cuidado extremo, como se quem as pudesse tocar fosse privilegiado por isso. Imaginei que seria porque a maioria das pessoas ali fosse homem, e as poucas mulheres fossem velhas ou deformadas pela radiação, e isso fizesse sua masculinidade aflorar. Mas a verdade era que olhar para as fotos daquelas mulheres os fazia lembrar de suas próprias mulheres ou filhas, e a maioria sabia que, caso elas estivessem vivas, sem a proteção de um homem, ou teriam tido muita sorte ou estariam trabalhando como prostitutas para poderem sobreviver. Era triste pensar em tudo aquilo, mas, como sempre, meus pensamentos foram interrompidos:

-Peguem-nos! - Gritou um dos homens que servia bebida, enquanto erguia um homem que havia caído no chão. Ele esticou o braço e apontou para mim e Thompson, com um olhar de assombro e raiva no rosto. - Eles envenenaram as bebidas.

Por toda a volta uma chuva de álcool caiu quando todos os que bebiam cuspiram o que tinham na boca. Lembro-me de que todo o álcool que eu havia bebido e que turvava minha mente desapareceu instantâneamente, enquanto uma descarga de adrenalina se espalhava como um raio pelo meu corpo.

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